sábado, 10 de março de 2018

A ética e o amor no comportamento humano



 A ética e o amor no comportamento humano.
Por definição o homem é um ser consciente e responsável. A coerência desse modo de ser elevada à última  potência deverá conduzir a um comportamento  ético. Na prática, os procedimentos inerentes  acabam elegendo normas  cujo cumprimento cerceia as manifestações de egoísmo das pessoas no convívio social. As regras eleitas passam a ser, então, a base de uma pedagogia manipulável mediante gratificações e punições oferecidas e impostas, respectivamente, no sentido de estimular condutas desejáveis e coibir as indesejáveis, em benefício de uma convivência pacífica. Mas quando o homem vive na plenitude de sua capacidade racional, de sua sensibilidade emocional e da própria vontade é levado a agir solidariamente; fazendo empatia com seus pares  e vivendo visceralmente um “nós comunitário” vai além da simples obediência aos cânones éticos direcionados primacialmente à obrigação de respeitar o bem do outro. Uma alma evoluída ama o seu próximo como a si mesma, e dessa forma se capacita a elaborar suas próprias leis. Nesse sentido alinha-se  à afirmação  de Santo Agostinho quando disse: “Ama e faze o que quiseres”. Essa orientação está relacionada à prática do amor-caridade que implica necessariamente na realização do bem estar do outro, ou seja, na prática de ações espontâneas resultantes do exercício da empatia, comum na vida de muitos santos, e que representa a mais elevada forma de darmos testemunho de nossa própria humanidade. Em face de o comportamento empático não ser frequente como tendência natural determinante, verifica-se a necessidade de disciplinar a conduta  das pessoas o que torna indispensável a imposição do exercício de normas éticas cujo descumprimento expõe o infrator a punições determinadas pelo Estado de direito chamado a policiar as relações interindividuais numa sociedade organizada. Ou seja, quando não prevalece o comportamento empático amoroso impõe-se a intervenção de uma autoridade externa mediante aplicação de códigos legais para controlar a ação dos indivíduos no convívio social. Ai está a diferença entre a visão ética e a leitura existencial empática da conduta solidária dos que integram o grupo social humano. A visão ética é policialesca, enquanto a amorosa (empática) emana do sentimento de identidade entre as pessoas que compõem a coletividade. Não é certo, porém, que a imposição da prática do dever moral possa levar por si só à realização pessoal do amor ao  próximo, todavia, somente a vivência deste amor solidário é capaz de transformar os indivíduos.  Quando isso acontece é por virtude de um salto de qualidade na evolução do homem, o que caracteriza uma verdadeira conversão. O comportamento normativo (ético) é voluntaria e formalmente virtuoso, porém não necessariamente empático (amoroso); nele impera o respeito ao outro pela submissão a uma coleção de leis, e não pelo amor, embora, convenhamos, o respeito venha a ser o primeiro passo na direção do amor. A diferença fundamental é que na conduta amorosa propriamente dita há um envolvimento cognitivo afetivo harmonioso, absorvente, entre as pessoas; ao passo que na conduta apenas ética existe em perspectiva a espera de um ganho, ou o temor de uma privação que alimentam o esforço comportamental para uma convivência harmoniosa. No primeiro caso (conduta amorosa) o homem é livre, não há amor sem liberdade; no segundo, os pares estão sob a tutela (submissão) de códigos legais que protegem a harmonia social. A disponibilidade de cada um para a doação de si mesmo inerente à  prática do amor-caridade é que liberta o homem do medo, inclusive de sua própria morte. Daí porque dizemos que só amando o bem do outro o homem é verdadeiramente livre.
Tomando a prática do amor caridade como o ápice da perfeição humana evidencia-se que o homem nasce com a capacidade de amar, porém deverá desenvolver esse talento mediante disciplina pessoal envolvendo o domínio das tendências egoicas que se insinuam espontânea e insistentemente. No caráter evolutivo do homem está implícita sua própria perfectibilidade, capacidade que envolve a administração competente de todas as funções psíquicas superiores do ser consciente (consciência reflexiva, sentimento e vontade) exigidas na prática do amor-caridade.
Todas as mazelas que afetam a humanidade decorrem de tropeços na dinâmica psicossocial  que obstruem de forma pessoal  e estrutural a prática do amor-caridade.

Em resumo o amor-caridade é necessariamente ético, mas a moralidade das relações humanas não é necessariamente amorosa.
Everaldo Lopes