Tudo que dissemos na publicação anterior
intitulada “O UNIVERSO TAL QUAL O VEMOS” diz respeito à realidade
mensurável diante da qual nos colocamos. Mas o big bang que inaugura a
dimensão material do Universo conhecido representa apenas um momento crucial da
caminhada evolucionária que, finalmente, ensejou no homem o exercício da
consciência reflexiva. O big bang foi uma explosão inigualável, sem
dúvida, mas explosão do que(?). Pode-se insinuar, hipoteticamente, a possibilidade
da explosão de um buraco negro, uma super condensação de matéria, tão intensa
que sua força de gravidade não permite escapar sequer um raio de luz,
tornando-a invisível (a matéria superconcentrada). Mas isso não é tudo. De onde
veio esta matéria? Aqui nos deparamos com um problema metafísico. O que
existiria antes do aparecimento da primeira partícula subatômica?
Escapa-nos a menor ideia sobre o que havia antes disso, necessariamente
algo que ultrapassa a percepção dos nossos sentidos. Para encher esse mundo imaterial
introduzimos no nosso vocabulário o conceito de espírito, como uma entidade
superior que dispensa a matéria. Algo que não se pode medir nem avaliar
quantitativamente, que não tem realidade palpável e que só reconhecemos pelos
seus efeitos. Todavia continuamos ignorando como se deu a formação da primeira
partícula material.
No seio da doutrina criacionista (que
se prolonga no evolucionismo), o espirito está em tudo, mas só no homem ele se
manifesta através de funções complexas específicas como a inteligência, a
consciência reflexiva, a memória descritiva de experiências anteriores. Só a
organização complexa do sistema nervoso central do homem permitiu, no curso da
Evolução, a manifestação do espírito eternamente presente em tudo,
capacitando-nos, os homens, para a organização de uma linguagem comunicativa
rica de recursos expressivos. No padrão místico do texto bíblico o espírito diz
respeito a uma entidade imaterial que pertence ao mundo sobrenatural. Ora,
sendo imaterial o espírito é indivisível, mas é capaz de refletir a realidade
em pormenores, demonstrando em si, essencialmente, a capacidade de
sensibilizar-se vivenciando a verdade do nosso conhecimento sobre o mundo em
que vivemos e experimentando o “amor ao próximo”.
Na
intimidade do espírito puro somos todos um; prevalecerá, então, a harmonia
absoluta. Mas ao manifestar-se no homem o espírito sofre as restrições impostas
pelo atavismo animal inerente à biologia humana que ameaça toldar as
manifestações espirituais, com a expectativa dos prazeres da carne que seduzem
através da tentação do gozo imediato. Ora, sendo o espírito eterno e
imutável será a vivência de sua harmonia absoluta que cada um de nós há
de experimentar quando se libertar, após a morte biológica, da roupagem
material indispensável à sua
manifestação no tempo. Imagino que no mundo espiritual só cabem as vivências
construtivas de verdade, bondade e beleza. Se o espírito sobrevive
às manifestações biológicas, ao livrar-se da dimensão corporal guarda apenas as
vivências construtivas que experienciou durante sua permanência temporal. Ainda
como consequência do argumento tomista (o mal é a ausência do bem) o mal
não tem lugar fora do mundo temporal, pois, definido como a ausência do bem não
cabe no puro espírito onde só prevalecem o amor, a paz e a criatividade de
valores positivos. No espírito dos que, ao monitorar a existência humana, não
experimentaram as vivências construtivas de verdade e amor fraterno
certamente elas, as virtudes construtivas, permanecem como possibilidades
insatisfeitas. A consciência dessa insatisfação permanente é o background de
uma caminhada inglória! Só o amor constrói para a eternidade. Que inferno pior
do que caminhar eternamente para nada? A doutrina espírita contorna o problema
da perfectibilidade do humano introduzindo o conceito de reencarnação do
espírito em vidas subsequentes, até alcançar a perfeição que lhe é inerente. O
pensamento cristão que defendo é compatível com a integração da alma humana no
seio do spírito eterno; uma vez que há
um só espírito.
Numa perspectiva espiritualista a morte como
aniquilamento total não existe, pois, o espírito sobreviverá às suas
manifestações temporais, purificado, ao participar das primícias da eternidade.
Alcançado o patamar superior da existência ou modo de ser próprio do homem, o
prolongamento da vida biológica, indefinidamente, redundaria na privação de uma
experiência inexcedível de liberdade, criatividade e integração com o absoluto
criador, sem qualquer interferência material.
A incerteza do que está por vir após a morte
biológica enseja o maior de todos os medos que acometem o homem. Mas a
infalibilidade da perfeição do Criador garante ao homem superar sem
traumas o medo de morrer. Acabamos por entender que a ideia de tudo
terminar com o fim da vida biológica é incompatível com a definição de um Deus
criador, e no fim o Espírito (eterno) reinará como um absoluto. Ora, sendo o
Criador, necessariamente, um absoluto, nada mais existe fora d´Ele. Ele é o
princípio e o fim de tudo que existe ou poderá existir. Mas só se capacitam
disso durante a existência temporal os homens que em sua vida biológica não se
deixaram vencer pelo atavismo animal e viveram com intensidade o amor à verdade
e a solidariedade entre seus pares.
A evolução da matéria até e emergência de um
ser consciente reflexivo aponta para a caminhada evolutiva em busca de uma
ordem crescente, o que remete a uma consciência eterna, ordenadora, inerente ao
Deus criador - um absoluto - princípio e fim de tudo quanto existe. Pois
uma ordem crescente no processo evolutivo implica numa intenção prévia, e não
há intenção sem consciência, no caso uma consciência universal. Por definição,
nada existe fora do absoluto; este absorve o tempo, de modo que nele não há
passado nem futuro, tudo é presente eterno, infinito. O homem é um projeto
perfeito de organização da matéria, mediante a complexificação crescente desta matériaT,
que ensejou a vida consciente - manifestação do espírito - necessária para o
exercício do amor e da solidariedade, virtudes indispensáveis à sobrevivência
do homem e ao prolongamento da Evolução.
Everaldo Lopes