A consciência é sempre
consciência de algo que a mente registra como um conceito, termo mental do ente
percebido pelos sentidos, ou de uma emoção vivenciada. Os conceitos assim
originados na subjetividade do ser consciente se arranjam em proposições e
estas por sua vez se relacionam de forma silogística induzindo a conclusões
lógicas que resumem um conhecimento. Os conceitos são simbolizados por palavras
que representam no discurso os entes materiais apreendidos pela consciência, e
os estados de ânimo vivenciados. Mediante uma operação mental reflexiva o
sujeito da consciência articula as palavras, gramaticalmente, numa linguagem
através da qual se comunica com os seus semelhantes. A capacidade de pensar e
intuir é anterior à de verbalizar o
pensamento num discurso coerente.
Os princípios da lógica asseguram
a consistência do conhecimento racional da realidade e a coerência do discurso.
Assim a análise lógica da linguagem ajuda a raciocinar objetivamente. A lógica inerente
às leis do pensamento aplicadas com retidão intelectual sobre os dados já
conhecidos propicia a geração de novos conhecimentos. Um exemplo disso é a
descoberta de Netuno cuja existência foi prevista mediante cálculos matemáticos
baseados nas variações da órbita de Urano, e só depois o novo planeta foi visualizado.
A sabedoria Implica na relação
funcional entre a capacidade de conhecer a realidade, a sensibilidade para a
interlocução racional respeitosa, e a vontade de agir de forma reflexiva,
prudente e sensata. Tudo isso associado à humildade para aceitar a realidade
com isenção. Disto se conclui que a sabedoria envolve o conhecimento seja erudito
ou intuitivo; porém ter conhecimento não implica necessariamente ser sábio. A
sabedoria pondera o significado inerente à realidade percebida tendo em vista o
seu contexto. Isso implica numa busca de sentido, ou seja, daquilo que as
coisas representam contextualizadas num todo significativo. O sentido transcende
o puro conhecimento racional; implica numa visão ampla da realidade que permite
enxergar a relação de uma parte com o todo no qual ela se inscreve. Detalhe fundamental uma vez que o “todo” coordena
a relação entre suas partes[1].
Na longa cadeia
evolutiva, o homem existe para refletir sobre e harmonizar a totalidade em que
está contextualizado, gozando o privilégio (liberdade) de reorientar-se para
atender às exigências de solidariedade no seu contexto existencial e social.
Fazendo parte de um sistema aberto, como
um ser de cultura o homem é a porta de entrada das mudanças que se fazem
necessárias para dar continuidade à própria Evolução. Neste esforço evolutivo se insere a capacidade humana de
organizar-se em sociedade, livre e solidariamente. Obviamente esta liberdade para
mudar não é absoluta. Esbarra na facticidade, ou seja, o que o homem não pode modificar
na sua realidade biopsíquica (hereditariedade, características físicas), e na
sua circunstância, inclusive seu habitat natural. É a partir deste nível da sua
realidade que o ser consciente elabora um projeto existencial com implicações
sociais políticas, econômicas, enfim, culturais. Manipulando os elementos
constitutivos da realidade psicossocial, o homem constrói sua existência. Neste
sentido, o critério soberano do comportamento humano é a responsabilidade calcada
nos valores éticos universais[2] das pessoas unidas por
elevados interesses comuns. Evolutivamente,
as mudanças promovidas pelo sujeito consciente devem garantir o futuro do Homo
Sapiens sapiens. E para fazê-lo é fundamental a avaliação das implicações
éticas das situações problemáticas no devir pessoal, e a disposição voluntária
de promover a escolha mais coerente em função do objetivo maior.
O tempo é essencial às
mudanças indispensáveis para manter o fluxo evolutivo. O vetor temporal da
evolução do homem implica em que suas ações deverão obedecer a um sentido
definido, consciente e responsavelmente escolhido, tendo em vista a realização
plena da condição humana.
A existência transcorre
no tempo do calendário que não é absoluto. Ele representa, antes, uma ruptura da unidade temporal porque na
sucessão dos segundos, minutos, dias, meses e anos intromete-se o “agora” que é
um limite difuso, encerrado entre o passado e o futuro imediatos de um presente
fugidio que não conseguimos descrever na sua realidade instantânea. Mas é nesse
agora que o homem existe cumprindo sua missão no processo evolutivo.
Existir é um vir a ser
consciente reflexivo, um constante transcender-se, um projeto que se vai
realizando mediante o exercício da liberdade. A consciência e a liberdade são
inseparáveis e não podem deixar de sê-lo. No dizer de Sartre “O homem está
condenado a ser livre.” A realidade humana do ponto de vista estritamente
fenomênico é feita de escolhas nas situações psicossociais criadas no vir a ser
pessoal. Ora, escolher implica exercitar a liberdade, ou seja, refletir antes
de agir; e as manifestações psíquicas superiores inerentes à reflexão não se
explicam como resultado de interações físico-químicas e feedbacks biológicos. Portanto,
a existência[3]
inclui necessariamente uma dimensão transcendental que se confunde com o
exercício da liberdade criativa. E no exercício responsável da liberdade impõe-se
ao sujeito do conhecimento usá-lo com sabedoria.
Everaldo Lopes
[1] Esta
ideia corresponde ao que preceitua o Holismo
- Na filosofia da linguagem, teoria que considera o significado de um
termo ou sentença unicamente compreensível se for considerado em sua relação
com uma totalidade linguística maior, através da qual adquire sentido.
Houaiss3.
[2] Verdade, ação correta, amor, paz, não violência.
[3] Modo de ser próprio do
homem