sexta-feira, 19 de novembro de 2010

A arte de conviver


Arte de “Conviver”
Se tudo é provisório, a proposta existencial mais sensata é viver intensamente cada momento, pois ele é único. Porém a condição humana exige que o instante fugidio seja vivido responsavelmente.
Conviver bem passa a ser, portanto, uma arte, a de viver a paixão do dia, do instante, sem romper a trama do contexto social em que se vive... uma vez que ninguém vive plenamente sem paixão, mas não pode dispensar o convívio social.
Ora, a paixão sobrepõe-se à lucidez, enquanto a convivência exige disciplina, respeito aos cânones culturais vigentes! Duas situações aparentemente incompatíveis! Mas é exatamente neste espaço conflituoso que se pratica a arte de conviver, adequando, criativamente, em cada momento, a paixão que alimenta o desejo de viver, e as normas culturais restritivas de cunho ético social. Arte difícil que exige habilidades e aptidões especiais, além do improviso e da criatividade.
No âmbito das artes convencionais, o artista goza de toda liberdade possível enquanto cria, no recesso do seu ateliê... a crítica repressora que poderia cercear a sua criatividade incide apenas sobre a obra concluída, ou seja, a tela acabada, a escultura, o livro, a produção musical, a coreografia. Por outro lado, a tinta e a tela virgem, o material plástico, as palavras, as notas musicais, o movimento, enfim, a matéria prima a ser trabalhada pelo artista convencional se lhe oferece pacificamente. Os Pintores, Escultores, Literatos, Compositores, Bailarinos se entregam à faina de exprimir suas intuições privilegiadas, manipulando, elementos dóceis às exigências modeladoras da inspiração artística. Mas para construir uma relação inter-subjetiva enriquecedora o “artista da convivência” trabalha a própria subjetividade no momento mesmo da interação com o outro. A matéria prima da “arte de conviver” é a relação inter-pessoal... envolve, necessariamente, a presença do “outro” que é também um ser querente capaz de impor condições. A liberdade compartilhada nesta relação implica, inevitavelmente, em delicados ajustes. Em cada caso os atores da interação precisam preservar a originalidade, sem prejudicar o diálogo. O reconhecimento mútuo da liberdade de cada um dos membros da relação inter-pessoal exige virtudes que não são dadas pela natureza. Custam um aprendizado... mas são indispensáveis, uma vez que a prática do “encontro” requer sempre uma negociação. Nestes termos, o maior rendimento se obtém quando há simetria entre os participantes da relação, no que tange à sensibilidade, ao autoconhecimento, ao equilíbrio emocional, à compassividade  e à autodisciplina.
Em resumo, a excelência de uma relação em que prevalece a interdependência resultará de um trabalho a quatro mãos, nunca da ação isolada de uma pessoa. Ninguém pode ser “artista da convivência” sem a colaboração do “outro”.
            A verdadeira “arte de conviver” é sutilmente veraz e fidedigna, não se confunde com o caviloso jogo de cintura, irmão do pragmatismo oportunista ao qual se resume para muitos esta arte milenar.
Portanto, o “artista da convivência” não cria sozinho. A sua obra será sempre uma co-criação, elaborada sob pressão, requerendo-se dos co-autores recursos pessoais que excedem os que se exigem dos  demais artistas.


quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Esperança


            O homem se dá conta da própria lacuna ontológica e busca um fundamento que a preencha. Encontra sua própria razão de ser no ato de perseguir esse alicerce existencial. Mas só o absoluto preenche a falta original, percebida como vazio pela auto-consciência. O homem anseia tornar o seu nada em algo significativo, fazendo desta busca sua realidade, num vir a ser criativo... idéia central do pensamento existencialista. Para esta tarefa hercúlea “faz da razão e da fé, os dois olhos da alma; da verdade e da crença os dois pólos da vida” como disse Guerra Junqueiro em “A velhice do Padre Eterno”.
A esperança e a fé se implicam, e vão além da razão. Nesta transcendência criativa o homem se constrói, preenchendo a falha original com um fundamento ontológico criado por ele mesmo... pois até o que lhe é “revelado”, passa pelo crivo da “existência”, o modo de ser peculiar ao homem, entendido como exercício da  consciência responsável.
Numa perspectiva dinâmica, esperança e a fé são o corolário da existência. Obviamente, a esperança e a fé só produzem os efeitos esperados se o seu objeto for absorvido como realidade pelo dinamismo pessoal. Neste movimento subjetivo a esperança é a âncora da fé. Pois que o ato de fé comporta dois tempos: dar crédito, e eliminar a dúvida. Quando não houver dúvida haverá certeza de fé. Mas, subsistindo a dúvida diante do absurdo - absoluto irredutível à razão - a esperança renova a fé, momento a momento. A esperança é o antídoto da dúvida resiliente, pois a fé não anula o absurdo - objeto da crença - apenas suspende a dúvida racional. Assim, a fé e a esperança se auxiliam mutuamente. É preciso crer na possibilidade de que algo ocorra para nutrir a esperança de que aconteça... afinal, como falou Unamuno, “ter fé não é crer no que não vimos, porém criar o que não vemos”. E é a esperança que sustenta a fé bruxuleante, quando a dúvida subjacente a ameaça. A esperança é arma poderosa contra o risco de perder a fé redentora.  
Nada faz sucumbir a esperança. Nem a frustração de amores não vividos ou de prazeres apenas sonhados, enquanto a  moenda do tempo, roda, roda, sem espremer da vida a ventura da existência plena de sentido. O galardão deste viver sofrido - busca sem fim da essência humana - é a certeza de havê-lo vivido com bravura, sem jamais ceder às tretas da impostura.
Se alcançarmos a dita de integrar-nos num todo absoluto significante e significado de si mesmo, teremos alcançado a sonhada plenitude, preenchendo a “lacuna ontológica”... máxima realização da aventura humana. Mas se nos escapar tal felicidade, seremos, ainda, almas em festa, palpitando no seio da esperança...  Certamente a vida plena transcende o vir a ser temporal sempre fugaz!...                            

Sejam todos bem vindos!

Resolvi criar um blog como uma forma de compartilhar minhas idéias... Espero que esta seja uma boa oportunidade.